14h30 – Cine Brasília – Sala de Cinema 2
Um princípio que está por trás da minha busca artística:
Algo que Freud chama de Unheimlich – Uncanny – O estranho familiar. O Ominous?
Todos os meus filmes exploram isso de alguma maneira.
Elena – O Duplo
(trecho – faça 18, 19, 20 anos e sinto que com as horas que passo chego mais perto de você)
Olmo e a Gaivota – O estranho familiar como o bebê que é hora monstro/ hora bebê, hora te devora, e te torna uma estranha a ti mesma, e exige a aceitação da morte da mulher que era antes dessa nova mãe e mulher transformada chegar.
(Olivia refletindo sobre como bebê está lhe comendo os ossos)
Democracia em Vertigem – O outro – pessoa da própria família, compatriota, se torna um estranho, se coloca do outro lado do muro, pede a volta da ditadura, você enquanto cidadão se vê ao lado de monstros, não reconhece o próprio rosto no espelho. A assombração é o próprio país que você já não reconhece.
(Momento em que filmo a manifestação de direita)
Apocalipse nos Trópicos – Dentro do movimento evangélico fundamentalista um movimento crescente que deseja o fim do mundo. Enquanto tantos outros sentimos que esse se aproxima – com pandemias e calamidades climáticas. Mas descubro que apocalipse do grego apocalypsis – não significa apocalipse e sim revelação.
(Não sei se eu sou o louco ou aquele que tem medo dele)
E isso é o princípio mesmo do unheimlich, uncanny – Aquilo que nos assusta, por ser estranhamente familiar, que nos aterroriza pois parece guardar o nosso fim, não é o nosso fim – mas sim uma revelação sobre facetas mais complexas de nós mesmos. De tudo aquilo que reprimimos. Como por exemplo – o tanto de pensamento mágico, místico e religioso que o “iluminismo” nos reprimiu, que a civilização “superou” mas que segue la, como força latente e na prática – como maior força política no Brasil hoje. Que se não encararmos ela de fato nos comera.
Decifra-me ou devoro-te.
Petra Costa
Há mais de uma década, Petra Costa tem contado histórias na interseção entre o pessoal e o político, tentando entender a sociedade desigual em que vivemos, com foco em seu país natal, o Brasil. Seu último e terceiro documentário, “Democracia em Vertigem”, foi indicado ao Oscar e listado pelo New York Times como um dos 10 melhores filmes do ano de 2019.